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O acrobata literário

Recentemente terminei de ler “Acrobacias no Crepúsculo”, livro do meu professor, colega jornalista e amigo Tibério Vargas Ramos.

Acrobacias no Crepúsculo - Tibério Vargas Ramos

Em março, quando soube que o escritor Tibério Vargas Ramos faria uma sessão de autógrafos do livro em Porto Alegre, fiz questão de prestigiar. Não só por ter sido meu professor, mas um professor importante, que muito me ensinou e ajudou a formar o jornalista que sou hoje, e o que ainda serei.

A obra, que eu não sei o quanto tem de ficção e o quanto tem de realidade, conta – a partir de dois pontos de vista – a história de um reservista da Aeronáutica, desde a juventude na fictícia cidade de Imperatriz, na fronteira do Rio Grande do Sul com a Argentina, até a maturidade, com filhos, netos e um longo passado.

Integrante da aeronáutica de perfil aventureiro, destemido e “moderninho” para os costumes de uma cidade do interior gaúcho nos anos 50, Atagiba Neto se casa com Ana Maria, filha do velho Tubino, conhecido fazendeiro e criador de gado da região.

O segundo ponto de vista da narrativa só entra na história, cronologicamente, bem mais tarde, dando um sopro de vida ao já maduro oficial reformado.

O livro traz um tom, digamos, bucólico. Não sei se o termo é bem este, mas o texto traz longas descrições de locais, costumes, conceitos sociais, fatos e lembranças que vão montando o quebra-cabeça da fronteira em meados do século XX. Uma coisa meio Érico Veríssimo em “O Continente”. Passada a primeira parte, e com os personagens devidamente identificados, começa o romance em si, e a aula de literatura.

Impressão Digital 2A escrita joga com os pontos de vista, ora com o narrador falando em primeira pessoa no masculino, hora no feminino, conforme o personagem que representa naquele trecho. E a mudança, muitas vezes, ocorre de um parágrafo para o outro, sem aviso. Longe de significar um problema, o texto é tão bem construído que vale a analogia apresentada no título desta crítica. Puro talento do autor…

Entendido o “funcionamento” da obra, o livro engole o leitor de uma forma doce, pelo tom suave e nostálgico, porém profunda. Diversos personagens (a ex-mulher e os filhos dele, o irmão dela, o tatuador, entre outros) orbitam este universo tornando a história cada vez mais intrincada e interessante.

Nesta primeira edição são exatas 200 páginas em 31 capítulos que se dissolvem com facilidade em uma história linear – apesar de nem sempre cronológica. Para mim também foi um prazer viajar pelos costumes, valores e anseios do Rio Grande do Sul dos anos 50, e pela Porto Alegre de hoje, que me é tão cara e conhecida.

A sensualidade, a busca pela “juventude”, as novidades tecnológicas e até mesmo as histórias (estórias?) que viram lenda com o passar dos anos estão ali, tornando o romance ainda mais verossímil, mais próximo do leitor.

No final ainda há uma surpresa que, na verdade, depois descobri, já havia deixado suas pistas. Um dos pontos altos do livro, aliás, é saber como terminar. No decorrer da obra são tantas histórias correndo simultâneas, se cruzando que, conforme a parte que falta do livro começa a diminuir, vem a pergunta: “Será que tem fim?”, ou ainda “Será que é satisfatório?”.

Eu pensei que iria ser de final aberto, ou quem sabe interpretativo… Bem, é claro que o final deixa janelas para interpretações. Não do final em si, mas sobre o sentido da história, do livro e da vida…

Pois o final é conclusivo, e bem conclusivo. Ainda que sempre haja mais o que contar, o fim do livro não deixa dúvidas sobre o que aconteceu, ou o que teria acontecido. Tudo se encerra com maestria no surpreendente final.

Agora pensando.. quem sabe se, no fim das contas, não estamos todos, dia a dia, fazendo  nossas acrobacias no crepúsculo…

Parabéns, Tibério!